sábado, 28 de novembro de 2009

Viva o povo da Bahia, viva a hospitalidade!


Por Paulo Atzingen


Salvador - O que tem caracterizado essa passagem por São Salvador é o contato com as pessoas; os negrões e mulatas, taxistas e cobradores de ônibus, garçons e balconistas dessa Bahia de Todos Os Santos, exaustivamente narrada e descrita na prosa de Jorge Amado, das décadas de 50 e 60, com seus estivadores e prostitutas que gravitavam em torno do Mercado Modelo. Hoje, sem puritanismo, diminuíram os estivadores e as meninas de programa estão um pouco menos camufladas, mas o espírito afetuoso do baiano que não liga para a crise do mundo e para a lama do cerrado, continua como um modelo para o Brasil.


Em que pese a difícil situação socioeconômica do Estado e das dificuldades traduzidas na vida prática do povo baiano, o espírito carnavalesco – embora enrustido no peito do soteropolitano que tem que levar o pão para casa todo dia – se aflora em sorrisos e bem tratar quando perguntamos: “Que ônibus vai para Itapuã?” Com aquela luminosidade peculiar do baiano (o sotaque é menor ao ouvido comparado há 20 anos atrás, quando aqui estive pela primeira vez, afinal a Bahia também experimentou o fenômeno da coisificação cultural), me respondem, assim meio rindo, assim meio cantando: “Pegue o Lapa ou o Flamengo que o senhor chega lá”.


Agradeço, no mesmo instante em que uma morena baiana que estava no ponto, e ouviu a conversa, acrescenta que havia outras opções de praia e me recomenda não ficar em Itapuã em dia de feriado nacional, mas ir adiante, para a praia do Flamengo.

Como são agradáveis os baianos! Não economizam em informar e - ao contrário do que se apresenta na crítica etnográfica – procuram a precisão. Não estão com pressa e isso quer dizer que se importam, pelo menos naquele instante, com as pessoas.

“Não vote em branco”

Com o novo calção de banho e a metade do dia para vadiar chego a Itapuã. A praia idealizada por Toquinho e Vinícius não é mais a mesma, pelo menos em dia de feriado nacional. Salvador é hoje a terceira maior metrópole brasileira em números de habitantes e os meninos, conta-me a vendedora de acarajé, estão nascendo e sendo criados pelas mães ou pelas avós. O congestionamento de vendedores de picolé capelinha, birinigth, queijo assado ao melaço da cana, entalhes em madeira, camisetas estampadas, penduricalhos de coco, balangandãs de prata e ostras com limão e sal mostra a luta do povo baiano para a sobrevivência em detrimento dos governos que têm. Antes o congestionamento de ofertas e produtos do que o congestionamento de carros e inércia.


O rastafari, retinto como a asa da graúna, passa com uma camiseta branca com letras escuras garrafais: “Não vote em branco”. E me abre um sorriso para conquistar freguês europeu. Nessa inter-racial São Salvador, onde a cor do mar, do sol e do som prevalecem, a mensagem é para não pensar-pensando, nesses dias que antecedem as eleições de 2010. Piriripororó, piriripororó piriripororó! canta o vendedor de queijo com sua panela de pressão carregada de brasa e carvão. Espanta a tristeza enquanto atrai freguesia com seu jeito garoto de comerciante. Piriripororó! Vende quatro, cinco, seis espetinhos de uma só vez para um grupo de turistas. Vai pela areia cantarolando feliz o seu mantra de sobrevivência: piriripororó, piriripororó, piriripororó...e se perde na direção do farol.

Começa um sururu. E a turma do deixa-disso logo aparece apartando os briguentos. Imediatamente sai da cena musical Toquinho e entra o Gil com seu Domingo no Parque. “Lá perto da Boca do Rio foi que ele viu Juliana na roda com João”. É briga política de cabos eleitorais? Não, é desavença passional. Paro na baiana e almoço um acarajé com pimenta e, como sobremesa, um pastel de queijo provolone. Sacramento a síntese gastronômica de meu estômago e do meu país. A baiana me trata cordialmente e pergunta se quero outro acarajé ou um vatapá; agradeço e saio bebendo minha água de coco, com uma sensação de ser bem atendido. O barraqueiro me traz a cadeira, o guarda-sol e o álbum de fotografias de um passeio que fez a Itaparica com a família. Isso é para me sentir em casa, e me senti.

Essa hospitalidade para os sismógrafos técnicos do turismo, pode parecer resultado de programas de formação de receptivo, financiado por algum órgão fomentador de normas e condutas. Pode ser, mas não é. Esse modo espirituoso, alegre, por vezes debochado de tratar bem um ser humano (seja ele repórter, turista, executivo, mineiro ou capixaba, inglês ou croata), é parte integrante da terceira veia que irriga o coração brasileiro, e em especial o do soteropolitano, que quer dizer povo da Bahia. Viva o povo da Bahia, viva a hospitalidade!

Serviço:
O quê: Bahia de São Salvador
Quando: O ano inteiro
Endereço: Costa Nordeste do Brasil
Patrocínio: Sol, praia, mar e vento
Realização: Todos os Santos

Direção Geral: Jesus Cristinho

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